IDOLATRIA À SOBRAL
Que seria isso? Qual a razão de as pessoas manifestarem um amor tão grande à Sobral, cidade interiorana da zona noroeste do estado do Ceará, distante 275 quilômetros de capital Fortaleza? As razões são muitas. O objetivo desse blog é acolher aqueles que amam Sobral, idolatrando-a como terra de tamanha beleza, geradora de muitas personalidades admiráveis. Sejam bem vindos a esse espaço de debates e conhecimentos gerais sobre a "Princesinha do Norte" metrópole do nosso coração.





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terça-feira, fevereiro 23, 2010

UM POUCO DE POLÍTICA SOBRALENSE- ANÁLISE DAS CAMPANHAS ELEITORAIS DE 1970 E 1972

Esse trabalho de pesquisa foi feito por ocasião da minha monografia de graduação no curso de Ciências Sociais da UVA, onde estudei as memórias do moradores de uma vila sobralense de nome São Vicente, desapropriada e demolida para construção do Perímetro Irrigado do Açude Ayres de Sousa-Jaibaras. Na compreensão de como estava a situação política sobralense no momento da desapropriação da referida vila, achei por necessário fazer um estudo sobre a política eleitoral do município antes e depois da intervenção do Governo Federal, dando ênfase nas campanhas eleitorais de 1970 e 1972, quando o boato da desapropriação já chegava aos ouvidos dos antigos moradores. Não farei no presente momento a análise das gestões dos candidatos estudados.
Diante da necessidade de informações tão concretas e precisas como datas e números para a efetivação dessa análise, fui à procura da mídia impressa, dos antigos jornais da Diocese de Sobral, Correio da Semana. Através deles pude obter informações que unidas com as fornecidas por antigos moradores de São Vicente, bem como sobralenses informados da política da época pude fazer essa síntese.
Desde o princípio da história sobralense, as disputas pelo poder, pelos cargos de mando, foram e ainda são lideradas por indivíduos de famílias tradicionais do município, muitas ligadas aos antigos coronéis, os donos de extensas faixas de terra na ribeira do Acaraú. No decorrer desse ensaio o leitor poderá ver os sobrenomes dos atores sociais envolvidos nessas disputas. Para que isso fosse melhor visualizado, forneço em nota os nomes dos candidatos a vereadores que concorreram nos pleitos e os que foram empossados.
Na primeira metade da década de 60, Sobral tinha como prefeito Cesário Barreto de Lima que apoiado por Chico Monte derrotou Jerônimo Medeiros Prado (comerciante em Sobral, natural de São Vicente e bisneto de Vicente Bezerra de Araújo) apoiado por Pe. Palhano nas eleições de 1962.
Em 1966 aconteceram as eleições para prefeito e vereadores. Disputando pela conquista da Prefeitura municipal Jerônimo Medeiros Prado , derrotado nas últimas eleições, vence Joaquim Barreto de Lima (Quinca).
No dia 20 de setembro de 1970 os partidários da ARENA-Aliança Renovadora Nacional (partido de direita, apoiado pelos militares) reuniam-se no auditório do Colégio Sobralense para escolha dos futuros candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereadores .
Em Sobral a ARENA dividia-se em duas facções fortemente opositoras: ARENA 1 E ARENA 2. Em função da desistência do Dr. Francisco Figueiredo de Paula Pessoa (Presidente do Diretório do Partido em Sobral), a ARENA 1 indica o nome de Vicente Antenor Ferreira Gomes Filho (Dr. Nozinho) e Manoel Elísio Feijão para concorrerem ao posto de prefeito.
A ARENA 2 indica Joaquim Barreto de Lima (que já havia sido prefeito) e José Frota Carneiro, tendo como slogan de campanha “O homem é o Quinca”.
O MDB-Movimento Democrático Brasileiro (partido oposto aos militares), legenda pouco expressiva na época, ao menos no município de Sobral, nesse ano lançou apenas a candidatura de vereadores .
A campanha política tem grande importância para a vida social local. Em Sobral, a movimentação na cidade aumentava, proporcionando um novo clima que mexia com os ânimos da população. Os comícios transmitidos pelo rádio permitiam que a população residente na zona rural, impossibilitada por motivos diversos de comparecer aos eventos políticos, não deixasse de sentir o mesmo que os moradores da zona urbana.
Em São Vicente, segundo contam alguns moradores, a movimentação nesses tempos era muito intensa, com comícios em frente a Escola Joaquim Barreto de Lima e festividades animadas ao som de bandas de música. Nota-se aqui o uso da banda para atrair multidões.
Observando o artigo de PALMEIRA (1996), sobre os resultados de uma pesquisa em área específica por ele estudada, o mesmo afirma que em meio à uma política faccional, como que acontece em nosso país, o voto não é uma escolha propriamente dita, o fator principal para sua escolha, longe de ser uma decisão pessoal, está relacionado à um processo onde intervêm unidades sociais mais amplas que buscam antes do voto, a adesão, sobre a qual estudaremos a seguir.
Sem querer descartar o voto consciente e ideológico, nas campanhas eleitorais de Sobral na época, não muito diferente dos nossos dias, basta observar o artigo em que FREITAS (2003) analisa o pleito municipal de 2000, o eleitor adere ao candidato, não por ele ter as melhores propostas para gestão, mas porque acredita que o mesmo vai vencer a campanha. O candidato, nesse caso, exerce sobre o eleitor uma paixão tal qual a de um time de futebol sobre os que por ele torcem, os quais esperam ver seu time como vencedor.
Nesse caso, a quantidade de pessoas em comícios e passeatas, interfere na adesão do eleitor.
A adesão, segundo PALMEIRA (2003), está diretamente ligada à lealdade (compromisso pessoal), enquanto a última, associada à solidariedade familiar, aos laços de parentesco, amizade e vizinhança. Nesse caso o eleitor tem a obrigação social de votar no parente que está a candidatar-se.
Além dos laços de parentesco – o que é muito comum em Sobral na época – a lealdade política está ligada ao favor devido em determinada circunstância da vida.
Afirma ainda que além da adesão e do voto, pesa também a declaração pública do mesmo, da qual o candidato beneficia-se por meio da “coerção moral”.
Segundo o autor estudado, o eleitor indeciso não é dos mais procurados, buscam-se com maior intensidade os cidadãos de “voto múltipo”, indivíduos que por sua inserção social, dispõem de seu voto e o de pessoas a ele ligadas por algum tipo de lealdade. São eles pais de grandes famílias, líderes políticos (cabos eleitorais) ou religiosos. Os mesmos são mais procurados porque com alguma justificativa, como por exemplo, um conflito, podem mudar de lado, trazendo consigo os votos dos eleitores a eles associados.
É comum nessa época encontrar nos editoriais do Jornal Correio da Semana fortes críticas à política local, a “falta de conteúdo ideológico”, ausência de mensagem democrática e a falta de respeito para com os adversários por meio de insultos pessoais.
Exemplo disso é o editorial com teor bastante crítico, que pode ser visto no jornal supra-citado, publicado um dia antes das eleições. Dele transcrevo apenas um pequeno trecho:

Encerra-se amanhã mais uma maratona política. De qualquer maneira uma experiência democrática bem positiva. Pergunto a mim mesmo: Foi válida a experiência?... Creio que sim... Pelo menos deixou-me uma convicção: nossa gente ainda não está devidamente preparada para o pleno exercício da democracia em seu mais autêntico sentido (...). Parece-me que precisamos educar o povo aos legítimos ditames da democracia para ele mesmo não ser vítima de distorções ideológicas. O rastro de insultos, de inimizades e crimes de morte é todo um triste saldo desta campanha política. Aquêles que conseguirem a palma da vitória, irão arquitetar planos para o ressarcimento das imensas despesas da campanha. (Fragmento do editorial do Jornal Correio da Semana de 14 de novembro de 1970)

No dia seguinte a esse artigo, 15 de novembro do mesmo ano, aconteceram as eleições. Em Sobral, a 24ª Zona Eleitoral, haviam 33.831 eleitores inscritos, sendo que naquele dia 22.351 compareceram às urnas distribuídas em 122 secções, sendo três localizadas na vila de São Vicente. Eram elas:

16ª Secção:
Local: Salão Escolar
Presidente: João Brismar Sales Martiniano

55ª Secção:
Local: Grupo Escolar
Presidente: Almino Rocha Filho

116ª Secção: Salão Paroquial
Presidente: Raimundo da Frota Lima

O Jornal Correio da Semana de 21 de novembro daquele ano informa que as eleições foram tranqüilas. Até aquele dia, em função da lenta contagem de cédulas eleitorais de papel, 63 das 122 urnas haviam sido apuradas no Palace Clube de Sobral (atual Centro de Línguas Estrangeiras). O candidato Quinca (5.235 votos) já apresentava maioria em relação à seu opositor Dr. Nozinho (4.693 votos).
Mesmo obtendo superioridade de 1.677 votos nas 52 urnas dos distritos, Vicente Antenor é derrotado por Joaquim Barreto que conseguiu ultrapassá-lo com 2.794 votos nas 70 urnas da sede do município, vencendo com maioria de 1.117 votos.
O periódico de 28 de novembro noticia um conflito de partidários da ARENA 2 com partidários da ARENA 1 que comemoravam a vitória de seu candidato em comício na Boulevard Pedro II. Vejamos um trecho da reportagem:

(...) se desentenderam e houve verdadeira chuva de pedras de lá pra cá e vice-versa, resultando várias pessoas feridas, porém sem nenhuma gravidade. A polícia compareceu ao local e usou a energia necessária para encerrar a confusão. (Trecho do Jornal Correio da Semana de 28 de novembro de 1970)

Situações como essa, demonstram os constantes conflitos entre eleitores das duas facções concorrentes da ARENA.
Em meio a todos esses conflitos, Quinca, como era conhecido popularmente, que saíra vitorioso nas últimas eleições, assume a Prefeitura Municipal em 25 de março de 1971. Esse foi uma dia de grande festividade em Sobral, do Alto do Cristo foi feita uma salva de tiros e realizada uma passeata pelas ruas da cidade, ao mesmo tempo em que eram soltos foguetes de todos os seus bairros. A programação foi encerrada com grande festa popular na Praça Quirino Rodrigues, com participação de diversos artistas, distribuição gratuita de bebidas e salgados.
O recém-empossado prefeito assumiu metas extensas que foram consideradas difíceis de serem executadas em editorial do jornal local pesquisado naquela semana.
Completando pouco mais de um ano que o então prefeito Joaquim Barreto de Lima foi empossado, consolidando uma gestão bastante curta, depois de muitas especulações e polêmicas em torno dos futuros candidatos à prefeito de Sobral, o periódico pertencente à Diocese de Sobral, no dia 19 de agosto de 1972 já informava o lançamento dos candidatos à prefeito de Sobral para o próximo pleito: pela ARENA 1 , Carlos Alberto Arruda (conhecido popularmente por Carrim, natural da vila de São Vicente) e vice Marcelo Barreto Alves que havia sido candidato à vereador pela ARENA 2 no último pleito (1970). Já pela ARENA 2 o candidato era o então deputado estadual (filho do ex-prefeito Jerônimo Prado) José Parente Prado. Este tinha como vice o Dr. Edson Andrade.
No mês seguinte, acadêmico da UVA José Euclides Ferreira Gomes era lançado como vereador pelo pai o Deputado João Frederico Ferreira Gomes .
Um exemplo claro de declaração pública do voto como estratégia de projeção política foi o de Carrim que, apoiado pelo prefeito Joaquim Barreto, em sua campanha eleitoral distribuía miniaturas de automóveis de plástico dizendo para o povo:
“–Vamos de Carrim para chegar primeiro.”
Em contraposição à estratégia de markting político de Carrim, Zé Prado dizia: “A pé é mais seguro, sem perigo de acidentes”. Daqui podemos compreender como surge a figura do chamado “Zé dos Pobres”, como ainda hoje é chamado Zé Prado.
Alguns grupos da cidade, inconformados com os então candidatos à prefeito procuram o governador César Cals para que indicasse um prefeito “à altura de governar Sobral”. Isso é o que pode ser visto na reportagem de 21 de outubro de 1972.
Nesse ano, as eleições foram realizadas no dia 15 de novembro e foram consideradas mais uma vez “tranqüilas”, é isso que informa a reportagem de capa do periódico pesquisado do dia 18 de novembro.
As apurações mais uma vez aconteceram no Palace Clube sob o comando da Juíza Eleitoral Dra. Gizela Nunes Costa. Até o dia 18 haviam sido apuradas 50 urnas. O placar provisório era:
José Prado- 5.028 votos
Carlos Alberto- 4.521 votos
Esse resultado parcial das eleições já indicava a vitória de José Prado que venceu Carlos Alberto Arruda com maioria de 2.197 votos .
Enquanto o prefeito eleito não era empossado, César Cals recebe em 1973 das mãos do então prefeito Joaquim Barreto o título de cidadão sobralense.
José Prado, que dias antes de empossar-se como prefeito ocupava o posto de deputado federal, era alvo de boatos que informavam que o mesmo não poderia assumir a prefeitura municipal. Tomou posse no dia 31 de janeiro de 1973.
No período em que acontecia a desapropriação de São Vicente, o favor de lideranças políticas aliadas, em Sobral e cidades circunvizinhas, foi crucial para moradores que se viram sem perspectiva de trabalho e moradia. Isso proporcionou a lealdade política de grupos de ex-moradores da vila estudada à líderes políticos.

Produzido por Cleuton Ponte.

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